2010/01/22

Convocatória a todos os amigos de Carlos Faria

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Um grande número de pessoas conheceu, admirou e beneficiou do valor da personalidade de Carlos Faria, um genuíno semeador de entusiasmos e "agitador cultural" como tanto gostava que o considerassem!...
A criação deste local da "net" situa-se a todas as latitudes e longitudes do planeta das nossas emoções, com centro poético-geográfico localizável na Ilha de São Jorge, nos Açores.

Vai desenvolver-se à medida das nossas possibilidades e pretende afirmar que Carlos Faria permanece como combustível da jovialidade e do amor pelos valores artísticos e culturais.

Apresentamos pois, como testemunho inaugural, páginas de uma verdade sem fissuras e de uma consistência literária sem margens: Prosema ao Karlos Faria ou São Jorge




Da autoria de Onésimo Teotónio de Almeida

In:
Onze Prosemas (e um final merencório)

Vila Nova de Gaia: Ausência, 2004.

De Lisboa tu chegavas carregado de produtos farmacêuticos embrulhados em poemas e novidades das artes e das letras onde se escondiam ideias ainda mais novas e que o mar não deixava fisgar da distância das ilhas há quinhentos anos encalhadas a meio do Atlântico apesar de esse dealbar dos idos anos sessenta ser já bem tardio no calendário mundial das comunicações

Nunca te vi com nenhum frasco de comprimidos nem de xarope mas as tuas conversas curavam os nossos resfriados apanhados nas correntes de ar que o Tenente-Coronel José Agostinho sabido de meteorologias e das maleitas do clima ilhéu nos dizia temer mais que um canhão
Da tua chegada sabíamos logo pelas páginas de A União da mesma tarde onde as tuas crónicas Pânikas explodiam as costuras da nossa costumeira prosa de vaga morta
E estalavas em metáforas que poriam em pé de guerra o Abel-da-mesma vernaculíssimo autor das minhas regras de estilística soubesse ele do nosso primeiro encontro na Rua de S. João onde a tua voz de barítono metálico quase fazia ecos no Monte Brasil contra a natural proibição do mar
Esperavam-te o Emanuel Félix ainda hoje sentado em Angra a pintar poemas e a contar histórias de S. Jorge nos serões
o Almeida Firmino alentejano vestido de ilhéu e ao mar tão afeiçoado que um dia nele decidiu deitar-se para sempre
o Rogério Silva pintor de um dentro luminoso e utópico a quem tu deste safanões e contagiaste com Palolos e Bartolomeus Cid
e mais a arraia de barba ainda frágil que o Santos Barros treinava na revolta vulcânica e mobilizava para terramotos sociais e políticos levado na nossa crença de então nos poemarmas
Eu andava noutras ondas e seguia tudo de binóculos até ao momento da coragem de me atirar de mergulho a uma conversa contigo na dita rua de São João à esquina da dos Minhas Terras que o Rogério pusera num quadro pelos meus olhos acarinhado sempre que em Lisboa vou a casa de José Enes nesse tempo como tu cavador daquelas águas
Não me lembro do que então te disse mas tenho a certeza de ter sido atabalhoado para mais só muitos anos mais tarde eu viria a descobrir a tua descoberta dessa ilha mítica de São Jorge chamada e a que tu cantavas hinos loucos
Raul Brandão navegador da luz açoriana não tivera oportunidade de descobri-la porque a voz de um pastor de ar desgraçado deixara-lhe marcada o resto da sua passagem na ilha por um travo amargo trágico
E saltaram-lhe adjectivos entre desamparada isolada e triste até funesta monótona e fúnebre e tudo por causa daquela figura tão inexpressiva que a Brandão deu vontade de fugir com medo fosse coisa de se lhe pegar
Acredito que a esse descobridor dos Açores faltou o tempo que tu tiveste por isso ganhou receio de contrair a doença da preguiça que te permitiu por lá quedares-te tempos sem tempo nem relógio e marinheiro bêbado sentares-te num calhau de basalto a ouvir a gente contar histórias fiadas até ficares a poder repeti-las com sotaque e tudo feito irmão de alma
E foram tantas as que te ouvi serões e serões mais tarde como aquela do continental na ilha (serias tu?) a correr pela rua abaixo e o jorgense a perguntar filosófico
Para onde é que o sô vai co'essa pressa toda? a ilha acaba já aí!
Eu fui também anos depois alargar lá o meu reportório e ainda hoje continuo a última sendo a de um aluno também jorgense em Ponta Delgada a confessar-me o seu dilema antes da minha conferência
Eu gosto destas coisas mas está um sol tanto bom lá fora!
E muitas mais histórias que tu e o Emanuel Félix contam sempre com o mesmo carinho por essa ilha de cabelos verdes e de corpo alto (itálicos roubados aos teus poemas meu caro!) onde o vento canta na erva, nenhuma altitude nos tira do pé do mar e toda a paz me acontece
Nessa ilha parada, só o mar viaja e tu deliciaste-te quando um tal João te disse que não trabalhava mais / porque não queria morrer rico a trabalhar

 Daqui de Providence estou a ouvir-te na página

Belo e admirável bom dia me deram hoje / os pescadores no Cais das velas! / Disseram bom dia com estrelas na voz / e flores nas mãos calosas
E lembras-te? de uma vez eu em condutor do jeep da Câmara contigo mais o Manuel Freire da pedra filosofal também apanhado pela ilha e ainda o Seixas Peixoto outro a não fugir com medo do contágio e hoje a namorar a ilha em quadros
Eu parei a perguntar por um miradouro a um velhote numa tasca e a resposta veio lacónica embrulhada em manha
O senhor faz como o Mário Soares Vai por aí fora vira à direita vira à esquerda toma prá direita e volta à esquerda que vai chegar sempre aonde o senhor quiser
Vai por tudo isso um abraço nesta homenagem com que em São Jorge te querem dizer Bom dia para durar até ao cerco da noite porque a ilha é assim: uma partida / para ficar!

Tu tens razão a ilha só tem regresso.


Foto vista no blogue: Rama da Oliveira... "Heróis do Mar"


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SÃO JORGE – PICO

poema de Carlos Faria,
São Jorge - Ciclo da Esmeralda (2.ª edição revista, 1992)

Diz o Poeta Almeida Firmino* que na Ilha do Pico
não há grilos! Ele é que sabe desta vida maravilhosa de cantores
que se perderam no fundo dos vulcões
e cantaram tão alto que perderam
as asas canoras nos fundos poemas da terra…

O João sorri, frontalmente, e concorda
que os grilos não podem passar o canal de barco
ou a nado…
Os grilos, às vezes, embarcam de asas coladas
nos sacos e malas dos emigrantes
e vão para a América: mas de lá
não vêm notícias de tais cantores
que se perdem nas ruas de Boston ou São Francisco,
atropelados pelos automóveis!...

Os grilos em São Jorge são bons companheiros
das noites: cantam e vão connosco
pela Ilha fora, anunciando
nas manhãs nocturnas
as passadas ganhas na caminhada!

A Ilha do Pico está a duas passadas do olhar…
Se não há grilos no Pico é por saberem
que Almeida Firmino os substitui com liberdade
e alegria!

Os grilos sabem que o Poeta-do-Pico
está atento a todas as asas
do mesmo cantar de fogo!

O João vai pedir ao primo que é pescador
e vai pescar todos os dias para S. Roque
que 1eve no barco grilos para o Pico. Depois
é com o Almeida Firmino: Ele que diga
aos grilos que devem cantar na erva
e não desaparecer nos caminhos frios
de basalto que vão ter ao centro da Ilha
onde o vulcão dorme aquele sono
que tira a voz aos cantores!

Cantar na erva, ao sol e ao luar,
é dever de todos os músicos
já que o futuro pertence aos seus cantores
entre enxadas e remos!

*Poeta alentejano (picoense por adopção).

Este poema de Carlos Faria, devidamente referenciado, foi uma participação de Olegário Paz, jorgense que vive em Lisboa, que nos foi prontamente transmitida por e.mail pelo nosso comum amigo Onésimo Teotónio de Almeida.
Esta plataforma de amigos está apenas nos seus começos (com imensos planos para o futuro próximo que tropeçam na carência de um total domínio das questões informáticas ) mas têm um e.mail que está sinalizado no lugar próprio do nosso perfil (carlosfaria1930@gmail.com) e que se encontra atento a todos os contactos que forem remetidos.



Esta foto foi vista no blogue "AÇORES - Quiosques de Turismo - NEWS ARTAZORES" onde, aliás, está publicada como ilustração de uma poesia de Carlos Faros do mesmo livro aqui citado "Ciclo da Esmeralda".

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Uma convocatória de amizades





Velas 1998 - Encontro de Escritores, homenagem a Carlos Faria

Este e os outros lugares da "net" indicados na coluna de ligações colocada à direita dedicados ao poeta Carlos Faria, vão ser destinado a registar depoimentos de natureza artística e cultural acompanhados de imagens, visões e ilustrações daqueles que foram seus amigos e admiradores, contemporâneos ou não.
O endereço para nos remeter esse material (incluso fotografias ou outros documentos, em formato jpeg com uma definição de qualidade razoável) é o seguinte: carlosfaria1930@gmail.com.
NOTA: Para mensagens de menor extensão e sem ilustrações É FAVOR recorrer ao formato normal dos comentários dos blogues, que aparece no rodapé de cada postagem.

Da colecção de um dos retratados na foto acima, Artur Goulart, o primeiro do lado esquerdo e ao lado de Carlos Faria, uma reproduçãoi artística de uma obra de Rogério Silva, grande amigo de ambos:



Composição
Óleo sobre platex - 70 x 120 cm / 81 x 129 cm c/ moldura (original) / assin.: Rogério Silva 969
Exposições:
“Temática Variada” (colectiva), Sociedade Amor da Pátria, Horta, Dezembro 1969 (cat.10)
“Temas Variados” (colectiva), Clube Asas do Atlântico, Santa Maria, Janeiro 1970 (cat. 7)
“Rogério Silva – Exposição de Desenhos e Pinturas”, Museu de Angra, Jan.1972 (cat. 4)

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